Marte em Escorpião

Publicado por Rui Sá Silva Barros

Preparando terreno para Saturno

Marte e Saturno em conjunção cumpriram o figurino: um terremoto no norte do Irã, muitos incêndios pelo mundo afora, tempestades tropicais e furacões. E muito mais na geopolítica.

Oriente Médio – As sanções econômicas batem forte no Irã, o governo começa novamente a falar na defenestração de Israel e convocou uma reunião de países não alinhados (uma relíquia da guerra fria) em Teerã. Para não ficar atrás, rumores em Israel relatam preparativos para um ataque com armas novas e potentes. A guerra civil na Síria transbordou para o Líbano e agora, com Marte em Escorpião, ameaça galvanizar de vez o conflito (mapa astrológico do regime sírio na última crônica, no fórum do site). O novo presidente egípcio trocou a cúpula da guarda pretoriana (forças armadas), combateu jihadistas na península do Sinai e o governo israelense não sabe o que pensar disto. O mesmo Marte açula os planetas em Leão no mapa de Israel. O mundo árabe tem uma grande quantidade de pobres e importa muito cereal e carne, cujos preços andam subindo em virtude das secas e enchentes nas áreas produtoras.

Ásia – Aumentou o nível de conflito no Pacífico norte em virtude de disputas por ilhotas desabitadas entre China, Japão, Vietnam, Taiwan e Filipinas, pesca e petróleo em tela. Na China, cujo mapa astrológico continua pressionado, a mulher do ex-dirigente Bo Xilai foi condenada num processo sumário, que faz parte da transição de poder neste final de ano com a renovação do Comitê Central do Partido, enquanto a economia desacelera impiedosamente e os dirigentes ainda não se acertaram a respeito. Marte em Escorpião também impacta o stellium de planetas em Leão do mapa da Índia, aonde ocorrem apagões de energia elétrica e o governo anda comprando armas além de qualquer limite razoável. No Afeganistão começaram a decapitar pessoas.

Europa – Férias de verão que ninguém é de ferro. O governo alemão tenta empurrar qualquer decisão mais séria para o ano que vem, quando terá eleição, mas é difícil arrastar isto por mais tempo. Os mercados deram uma trégua à Espanha e Itália, o governo grego pede mais tempo e a economia do bloco está parada, agora em estagnação total e sem prazo para a retomada. Marte transitará o Plutão natal do mapa da UE. Na Rússia para protestar é preciso obter uma licença do governo, do contrário multas e prisão, como acaba de acontecer com a banda de garotas do Pussy Riot. Enquanto isto, os ingleses ameaçam invadir a embaixada do Equador, onde Assange se refugiou, e criam outro conflito diplomático com o Unasul, os suecos prometem solenemente não deportar o jornalista para os EUA, aonde ele faria companhia ao soldado Manning, preso incomunicável.

EUA – Marte e Saturno, além de mais uma carnificina, levaram Paul Ryan à candidatura de vice pelos republicanos. Ele é um deputado federal, representante do partido no comitê do Orçamento, cuja receita (corte nos impostos dos ricos e nos benefícios sociais dos pobres) jogaria a economia americana numa recessão. A campanha ainda está em banho-maria e deve começar a esquentar, os candidatos continuam empatados com leve vantagem de Obama em alguns estados. Os republicanos fizeram sua convenção na Flórida sob ameaça de um furacão, batizado de Isaac, o patriarca judeu cego, um desses sinais que não podemos desprezar.

O furacão Isaac provoca alagamentos na Louisiania (28/8/2012)
O furacão Isaac provoca alagamentos na Louisiania (28/8/2012)

A dolarcracia venceu a lealdade dos marines e um deles publicou um livro contando o assalto à casamata de Bin Laden e sua execução, o governo está irado. A carta astrológica do equinócio de outono pode dar indicações mais claras sobre as eleições, no mês que vem. A conjunção no céu afetou a oposição Mercúrio/Plutão na carta do país. A FAO pediu ao governo americano que não destine muito milho para a produção de etanol neste tempo de vacas magras.

Já se lá vão cinco anos desde que o BNP Paribas anunciou a suspensão de operações de dois de seus fundos de investimento. De lá para cá a operação contenção (geopolítica e econômica) atuou com força total, a passagem de Saturno por Libra foi um tempo para negociações e acertos e quase nada foi resolvido, enquanto a pólvora estava sendo amontoada no paiol. Escorpião é signo de segurança (forças armadas, polícia e agências de espionagem), de segurança econômica (seguros, dívidas, o resultado da balança de serviços e capitais) e de limpeza do que está morto ou degenerado. É interessar assinalar que da última vez a medida drástica foi realizada quando Saturno estava em Libra, mas em conjunção com Plutão: durante a década de 1970 ocorreu estagflação nas economias do Atlântico norte, o Fed (o BC americano) elevou a taxa de juros bruscamente, o resultado foi que as economias da América Latina foram à moratória e a uma década perdida. A configuração astrológica era tremenda, com os cinco planetas lentos num espaço de sessenta graus. Saturno cruzou Escorpião de meados de 1983 até o final de 1985.

indianaA guerra Irã/Iraque assumia um aspecto sombrio e selvagem, Indira Gandhi (foto) foi assassinada, a ditadura argentina terminava depois do fiasco da Guerra das Malvinas, o Líbano e América Central estavam em guerra civil. Os soviéticos puseram Gorbatchov para dirigir os atos finais da Cortina de Ferro, enquanto os chineses diziam que enriquecer é glorioso. Um grande terremoto no México e o desastre de Bophal na Índia. Para apaziguar os sofredores o crack começou a circular.

Tudo isto na superfície, pois as placas tectônicas moviam-se: grande transferência de renda para os empresários através da automação industrial e exportação de fábricas, informatização de serviços, impostos camaradas, liberdade para o capital financeiro. Datam daí o fascínio com os psicopatas, criaturas infra-humanas, homicídios e acidentes que infestam o telejornalismo; o voyeurismo elevado à categoria de arte e a monetização da política.

O sistema surgido nestes tempos gerou grandes bolhas econômicas e escândalos políticos, entrando em crise recentemente para surpresa e desgosto de quem dirigia o processo. O que está em jogo é a continuidade do processo, sem dúvida possível, mas a que preço? Daqui em diante precisamos seguir Marte, senhor de Urano em Áries e Saturno em Escorpião.

Roberto Jefferson: "Sozinho eu não caio..."
Roberto Jefferson: “Sozinho eu não caio…”

PINDORAMA – O STF absolveu Fernando Collor por falta de provas e para que não se corresse o risco de apresentá-las, alguém mandou ‘queimar arquivo’, isto é, assassinar PC Farias. E ficou tudo por isto mesmo, estávamos em 94, o plano Real parecia trazer felicidade geral à nação, por que ficar revolvendo aquele lodo todo? Bem, havia pelo menos uma boa razão, pois durante aquele governo a presidência organizou uma bela quadrilha que funcionava implacavelmente. Os empresários, que apostaram todas as fichas no aventureiro, se arrependeram do mau passo e deixaram-no agonizar até o impeachtment. Agora está claro que o julgamento do mensalão não vai terminar em pizza, é provável que a maioria seja condenada. Não é o fim da impunidade. Os políticos ficarão mais cautelosos e astuciosos. O sistema político brasileiro produz corrupção e impunidade como a vegetação produz oxigênio, mas chegando a esta conclusão seria preciso fazer alguma coisa. Os juízes do Supremo são mais vaidosos que os juízes de Kafka, que contratavam pintores para imortalizá-los e a linguagem empregada continua a reverberar as ordenações manuelinas. A peça de acusação não conseguiu elucidar totalmente o trânsito do dinheiro e João Paulo Cunha foi um inocente inútil se aceitou mesmo 0,5% de comissão quando a praxe é 10%, mesmo em negociações entre empresas. Em tempo, o glorioso mandato de Collor foi acompanhado por um trino de Vênus progredida ao MC natal!

O Governo andou certo nos últimos meses com a baixa de juros e da dívida interna e agora com o pacote da infraestrutura. Quando informado dos detalhes, Eike Batista não se conteve e deixou sair: é um kit felicidade. Velha realidade! Nos tempos imperiais o governo, para atrair investimentos estrangeiros, dava uma rentabilidade mínima, garantia de juros de 7% ao ano. Belos tempos aqueles, em que os escravos eram açoitados em público para regozijo dos passantes. A moda pegou e nestes pacotes sempre há alguma garantia estatal, seja através do BNDES ou de fundos de pensão de estatais, com tarifas indexadas renovadas anualmente. Mas era preciso neste caso, os custos das estradas esburacadas para escoar as colheitas estavam chegando a um absurdo completo. Saturno retrógrado na carta natal impacta todo o sistema de transporte, comunicações, imprensa e educação básica. Sem comentários.

E marcou touca com os professores universitários. Eles foram enrolados a não mais poder durante o governo Lula, a greve era favas contadas. Mas os outros aproveitaram o embalo. Os salários de ingresso na Polícia Federal, Receita Federal e Anvisa, entre outros, estão em níveis bem razoáveis. Alguns milhares de trabalhadores paralisaram as alfândegas e os laboratórios ficaram sem reagentes, doentes sem remédios. Quem prestar um pouco de atenção sobre a marcha do orçamento, logo é atraído pelo aumento do funcionalismo… quanto maior o número de empregados na repartição, menor é a soma de serviços que presta; os poucos que trabalham são interrompidos pelos muitos que perturbam… não há funcionário que não se julgue mal retribuído, todos gritam… Isto foi escrito em 1883 pelo Senador Castro Carreira, num livreto sobre a história orçamentária brasileira. Na altura eram uns 15 mil funcionários civis! Atualmente o número não é elevado, não chega a 1% da população econômica, nem os salários são exorbitantes, mas o serviço entregue deixa muito a desejar. Dois sábios já se debruçaram sobre o problema (Hélio Beltrão e Bresser Pereira) e tentaram desburocratizar o Estado, em vão, está mais burocratizado do que nunca. É um Estado Frankenstein que ganhou vida própria, quaisquer que sejam os ocupantes. O negociador do governo é Sérgio Mendonça que durante anos dirigiu o DIEESE, portanto é um especialista sobre a mão de obra no país, sensível à miséria da maioria dos trabalhadores e a proposta apresentada foi razoável. Com o retorno de Marte à sua posição original na carta natal do país, o processo tende ao acerto.

A carga tributária estava em 24% ao final do governo Itamar, foi a 30% no de FHC e chegou aos magníficos 36% atuais, tudo para sustentar políticos, burocratas e familiares e alguns programas ineficientes. Os empresários vivem se queixando desta voracidade estatal. Lorota! Finalmente um deles conseguiu colocar os pontos nos iis, Jorge Gerdau, eles só pagam IRPJ o resto é repassado ao consumidor. Estudo recente do IPEA mostrava que a carga tributária paga pelos pobres é proporcionalmente muito mais alta do que é paga pelos ricos. Nem sequer o IR sobre pessoas físicas é reajustado, o que eleva a receita do governo. Cobrar imposto sobre comida básica é outro disparate, especialmente para um partido que se proclama popular. A receita do governo (carga tributária) deve ser vista na casa 11, a segunda do MC.

É natural que governos celebrem suas benfeitorias, mas aos analistas compete a tarefa de esmiuçar a realidade: há muita coisa a ser feita ainda no Brasil. Continuamos com uma péssima desigualdade de renda, água e esgoto precários, cortiços e favelas com uma população robusta, níveis de escolaridade baixos, sistemas de transportes urbanos arcaicos. Depois de 190 anos neste regime há quem tenha se acostumado, virou uma espécie de natureza. Nossa legislação é maravilhosa prometendo o céu e entregando um purgatório chato, a violência alcança índices absurdos e o crime organizado vive em simbiose com os três poderes da República, como demonstra o caso Cachoeira. Não é para desanimar, por aqui as coisas demoram um pouco, mas acontecem: nossos dirigentes levaram 80 anos para abolir a escravidão e 120 anos pra trocar o mil-réis, a velha moeda portuguesa, cortesia do Sol em trino a Saturno no mapa natal.

ULISSES – A Odisseia de Homero é uma viagem iniciática tal como o Pert Em Heru (livro dos mortos egípcio). Aqui o falecido tem que atravessar regiões tenebrosas e se vale de fórmulas recitadas para vencer os obstáculos. Em Homero as coisas mudam, Ulisses se vale da astúcia, os gregos eram um povo de marinheiros e comerciantes. Milênios depois um irlandês abordou novamente o tema, atualizando-o: Ulisses agora é Leopold Bloom, um judeu errante, vendedor de anúncios de jornal; casado com uma mulher, cantora e adúltera, pranteia um filho morto e atura uma filha que ensaia os passos da mãe. Telêmaco é Stephan Dedalus, um jovem adulto e órfão de mãe, lutando contra o legado católico em que foi criado.

james-joyceJames Joyce (foto) escreveu uma iniciação ao inferno da modernidade. A ação transcorre em menos de 24 horas e a primeira inovação é que temos que acompanhar todas as divagações de um homem comum, o que para muitos é um espelho insuportável. Consciente do declínio da importância da palavra escrita, Joyce recapitula muitos estilos em pastiches maravilhosos (Proust também foi um grande pastichador). Para ler e fruir o romance não é necessário ter lido Homero, mas o conhecimento dos paralelismos ajuda bastante. Ele iniciou a redação da obra em 1914 e retrata a tomada de consciência do fim do século de progresso e paz, foi lançado em 1922, ano de grandes obras literárias.

A descrição do fluxo de consciência foi realmente uma realização notável. Este tropel de imagens, vozes e palavras que nos assaltam durante as horas de vigília, não é natural, de maneira alguma. É fruto da urbanização, do ambiente de escrutínio obsessivo moderno e da hiperestimulação ambiental. É o maior obstáculo ao trabalho de concentração e união que busca o yoga védico. Joyce viu antecipadamente esta civilização de caixeiros-viajantes, onde todo mundo pretende vender alguma coisa, há alguns momentos no romance em que a tolice de Bloom nos cansa, mas é nesta tolice que passamos agora a maior parte do tempo, tentando consertar o passado ou controlar o futuro. Os caixeiros são pessoas simples e sem ambiguidades: se vende muito, a mercadoria é das boas.

Há, em qualquer parágrafo do Ulisses, mais esoterismo que nas obras desunidas de Paulo Coelho, este digno neto de Cagliostro, o bandoleiro patusco.

Matilde de Magdeburgo foi uma mística cristã que viveu no século 13. Ao longo dos anos escreveu o livro Luz fluindo da Divindade, de onde retiramos a passagem:

Estas são as palavras do canto, mas as vozes do amor
e o doce som do coração devem ser silenciados,
pois não há mão humana que possa descrevê-los.

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