O Arcano da Busca e do Amor
Ao contrário do que ocorre nos demais arcanos, a margem superior da lâmina não tem numeração, razão pela qual se costuma atribuir-lhe o valor de arcano 0 ou 22, segundo a necessidade. Um homem anda com um bastão na mão direita. Está de costas, mas seu rosto, bem visível, aparece de três quartos. Sobre o ombro direito leva uma vara em cuja extremidade há uma pequena trouxa.
O personagem está vestido no estilo dos antigos bobos da corte: as calças rasgadas deixam ver parte da coxa direita. Um animal que poderia ser um felino parece arranhar esta parte exposta ou ter provocado o rasgão. De um chão árido, acidentado, brotam cinco plantas. O viajante tem a cabeça coberta por um gorro que desce até a nuca e lhe cobre as orelhas; esta estranha touca transforma seu rosto barbudo numa espécie de máscara. Veste uma jaqueta, presa por um cinto amarelo; seus pés estão cobertos por calçados vermelhos.

Significados simbólicos
A busca e o Filho Pródigo. A experiência de ultrapassar os limites.
Espontaneidade, despreocupação, admiração, saudade.
Impulsividade. Inconsciência. Alienação.
Interpretações usuais na cartomancia
Passividade, completo abandono, repouso, deixar de resistir. Irresponsabilidade. Inocência.
Escolha intuitiva acertada. Domínio dos instintos; capacidade mediúnica. Abstenção. O não-fazer.
Mental: Indeterminação devida às múltiplas preocupações que se apresentam e das quais se tem apenas uma vaga consciência. Ideias em processo de transformação. Conselhos incertos.
Emocional: Revezes sentimentais, incerteza com os compromissos, sentimentos vulgares e sem duração. Infidelidade.
Físico: Inconsciência, desordem, falta à palavra dada, insegurança, desprazer. Abandono voluntário dos bens materiais. Assunto ou negócio enfraquecido. Do ponto de vista da saúde: transtornos nervosos, inflamações, abscessos.
Desafios e sombra: Enquanto andarilho, o Louco significa queda ou marcha que se detém. Abandono forçado dos bens materiais; decadência sem muita possibilidade de recuperação. Complicações, atoleiro, incoerência.
Nulidade. Incapacidade para raciocinar e autodirigir-se, entrega aos impulsos cegos. Automatismo. Confusões inconscientes. Extra-vagância. Castigo causado pela insensatez das ações. Remorsos vãos.
História e iconografia
Reis e senhores, desde épocas remotas, tinham bufões em seus palácios, verdadeiras caricaturas da corte. Histórias sobre eles, bem como as representações gráficas desse personagem, podem ser contadas às dezenas.
Mas a imagem deste Arcano – um louco solitário que atravessa os campos e é agredido por um animal – não havia sido representada até então: é própria do Tarô e, nesse sentido, representa uma de suas contribuições mais originais do ponto de vista iconográfico.

Tela de Jheronimus Bosch (1450-1516)
Van Rijneberk arrisca a hipótese de que o espírito burlesco e irreverente da Idade Média teria parodiado, neste personagem, a classe dos Clerici vagante que, segundo ele, eram “estudantes migratórios e inquietos, sempre em busca de novos mestres de quem pudessem aprender ciências e ideias, e de novas tabernas onde pudessem beber fiado um pouco de vinho bom”.
Mais de um autor vê nesses viajantes insaciáveis e pouco escrupulosos os primeiros agentes – talvez ignorantes da sua missão, mas de grande eficácia real – da Reforma religiosa. No desenho feito por Wirth aparece pela primeira vez impresso o termo Le fou (O Louco) para designar o arcano sem número, embora tradicionalmente fosse conhecido por este nome desde muito antes. Tanto o baralho Marselha original, bem como seus numerosos contemporâneos franceses (e os exemplares dos copistas espanhóis) chamam Le Mat a esta carta.
Paul Marteau levantou a hipótese de que este nome seria uma alusão ao jogo de xadrez, já que o protagonista está em cheque (pelos outros, pelo mundo), numa situação de encurralamento semelhante à do xeque mate. A palavra mat, no francês, significa “fosco, abafado, indistinto” e ainda o “xeque mate”, no xadrez. Já o termo mât, quer dizer “mastro”.
Outro estudioso do Tarô, Gwen Le Scouézec, sugere duas variantes etimológicas: o nome viria literalmente do árabe (mat: morto), ou seria uma apócope do italiano matto (louco, doido), nome com que aparece no tarocchino de Bolonha.
Fontes
Alberto Cousté, O Tarô ou a máquina de imaginar. Rio, Ed. Labor, 1977. (Fonte básica para a descrição inicial dos 22 arcanos maiores e para o ítem História e Iconografia)
Anônimo (Valentin Tomberg), Meditações sobre os 22 Arcanos Maiores do Tarô. São Paulo, Ed. Paulinas (O subtítulo da tradução espanhola (Herder, 1987) foi copiado nesta compilação)
Paul Marteau, O Tarô de Marselha. São Paulo, Ed. Objetiva, 1991. (Essa obra serviu de base para o ítem Interpretações usuais na cartomancia)
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